Por detrás das palavras que escrevo estou eu
Naquele dia, às seis horas da manhã, não havia mais
nada naquela praia deserta da Califórnia além de muito vento e um céu cinzento
que cobria toda aquela zona e que se perdia no horizonte. Diana caminhava entre
o nevoeiro e a sua respiração tornava-se cada vez mais pesada à medida que se
aproximava da linha de costa, à medida que ficava mais perto de fazer o que
viera ali fazer. As ondas embatiam com força contra as rochas por baixo de si e
ela, naquele momento, viu quão vulnerável e pequena era comparada com a
grandeza da natureza. Em seguida, tirou o papel que tinha colocado na
algibeira, respirou fundo duas ou três vezes e começou:
– Meu
querido, muitas vezes, ao longo dos últimos meses, procurei escrever-te algo
sólido e sincero sem que me faltassem as forças e me desfizesse (novamente) em
lágrimas. Muitas foram as vezes em que, sentada no parapeito da minha janela,
olhava para cima e procurava por ti, numa tentativa desesperada de te encontrar
na estrela mais brilhante do céu. Queria ver-te, falar-te, queria que visses
que sinto a tua falta e que lamento... lamento muito não te ter dito tudo o que
queria por não ter tido coragem...
A voz sumiu-se e, à medida que o vento lhe
despenteava os cabelos, uma lágrima rendida escorreu-lhe pela face. Quando, por
fim, conseguiu, ergueu a cabeça e prosseguiu:
– Sei
que agora estas minhas palavras não passam de uma sombra do que te deveria ter
dito e não disse. Estou consciente de que palavras não passam de palavras, mas estas
simples inocentes armas podem ser o refúgio de muitos que não têm coragem
suficiente para dizer o que querem dizer. Eu sempre fui contigo o tipo de
rapariga que se esconde nas sombras das palavras que escreve e isso, mesmo que
não se note, sempre me magoou. Por que haveria eu de ter receio de ti – umas
das pessoas com mais significado para mim? Desculpa-me por isto. Desculpa por
não me ter conseguido libertar desta sombra e, por isso, ter ficado presa a ti
todo este tempo. Mas, a partir de hoje, não; a partir de hoje, deixo-te para
finalmente ir, liberto-te para que possamos encontrar o caminho de volta a
casa. Posso não te ver, procurar por ti no mais estrelado dos céus e não te
encontrar, não conseguir distinguir o teu sorriso nas centenas de rostos que
vejo todos os dias, mas sei, porém, que aonde quer que vá, tu vens comigo, que
caminhas a meu lado a dar-me força a cada passo do caminho. Digo-te agora,
(desculpa a demora), o meu derradeiro adeus; sem mágoas, sem conversas
inacabadas e de coração leve. Vemo-nos em breve.
Dobrou o papel e deixou-o simplesmente tomar o seu
rumo pela imensidão do céu.
Sabia que não era preciso dizer mais nada, que, às
vezes, o melhor que podemos fazer é deixar que o silêncio se instale para que
se possa ouvir a voz do coração. Depois caminhou de volta a casa e, enquanto o
vento lhe puxava os cabelos para trás, Diana sorria porque, de certa forma,
tinha a certeza de que a mensagem havia sido entregue, porque ele, onde quer
que estivesse, já não a via como a menina indefesa que ele deixara, mas sim
como uma senhora que já não precisava mais de se esconder em qualquer sombra.
Mariana Pina Camarneiro
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