Até ao Fim da Terra de David Grossman
... a ler
Quando Ora se prepara para
festejar a desmobilização do filho Ofer, ele volta a juntar-se voluntariamente
ao exército. Num ímpeto supersticioso, temendo a pior notícia que um pai ou uma
mãe podem receber, Ora parte numa caminhada para a Galileia, sem deixar
qualquer rasto para os “notificadores”. Recentemente separada do marido,
arrasta consigo um companheiro inesperado: Avram, o melhor amigo de outrora de
ambos, o antigo amante, que tinha estado prisioneiro durante a Guerra do Yom
Kipur e fora torturado, e que, destruído, recusara sempre conhecer o rapaz ou
ter contacto com eles.
Durante a caminhada, Ora vai
desenrolando a história da sua maternidade e inicia Avram no drama da família
humana – uma narrativa que mantém Ofer vivo, tanto para a mãe como para o
leitor. A sua história coloca lado a lado os maiores sofrimentos da guerra e as
alegrias e angústias quotidianas da educação dos filhos: nunca se viu tão
claramente o real e o surreal da vida quotidiana em Israel, as correntes de
ambivalência sobre a guerra numa família, os fardos que caem sobre cada nova
geração. Numa situação de conflito coletivo e duradouro, como conciliar as
preocupações individuais de uma mãe que, afinal, prefere a companhia de um
filho à missão patriótica? Como manter a causa pacifista se aqueles que podem
atirar contra um filho são justamente aqueles com quem se quer fazer a paz? E,
no limite de Israel e de si mesmos, Ora e Avram descobrem-se um ao outro, a si
próprios e à sua condição de israelitas irreversivelmente exilados. Mas é
também no fim da terra conhecida, na fronteira com o inimigo, que se podem
restaurar alguns caminhos há muito bloqueados.
Ao imaginar prodigamente uma
família no amor e na crise, Grossman cria um dos maiores romances antiguerra do
nosso tempo.
“Ora, disse Avram, saboreando o nome,
e a doçura derramou-se-lhe pela boca e pelo corpo todo, O-ra.”
“A luz do dia espreita, eles
estão estendidos nas margens de um campo (…). Só ela e ele no mundo, mais
ninguém (…). Nesse momento, Avram abriu os olhos. Viu Ora sentada à sua frente,
encostada a uma mochila enorme.”
David Grossman |
Opiniões sobre a obra
“Muito raramente, poucas vezes
numa vida inteira, abrimos um livro que, quando fechamos, nada pode continuar a
ser o que era. Derrubaram-se muros, transpuseram-se barreiras, abriu-se em nós
uma dimensão do sentir, do próprio existir, que antes não tínhamos. Até ao Fim da Terra é um livro dessa
magnitude.
David Grossman é talvez o
escritor mais talentoso que alguma vez me foi dado ler; talentoso não apenas
pela sua imaginação, energia e originalidade, mas porque tem acesso ao
indizível, porque é capaz de olhar para dentro de uma pessoa escreve romances
sobre o que significa defender essa essência, essa luz sem par, contra um mundo
apostado em extingui-la. Até ao Fim da
Terra é o mais poderoso, demolidor e indómito de quantos livros já escreveu
sobre tal defesa. Lemo-lo e sentimo-nos dissecados, desmembrados, tocados na
essência do que somos; devolvidos, como se ao fim de uma longa ausência, à
condição de seres humanos.”NICOLE KRAUSS
“Livro avassalador pela sua força
e intensidade, esta é a obra-prima de David Grossman. Flaubert criou a sua
Emma, Tolstói a sua Anna, e agora Grossman dá-nos a sua Ora – uma personagem
viva e autêntica como não há outra na ficção recente. Devorei este longo
romance num estado de transe febril. É pungente, belo, inolvidável.” PAUL AUSTER
“David Grossman evoca na
perfeição a paixão amorosa e a sensualidade, a amizade masculina e as delicadas
nuances do quotidiano num país enfraquecido pela violência e pelo medo.” DIE WELT
Boas leituras.
Adélia Maranhão
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