"Sê plural como o universo!"
Liberto em múltiplo,
Fernando Pessoa viveu uma incessante [auto]interpretação do Ser. Fragmentou-se,
revelando as máscaras infinitas em que o ser humano se finge e se integra. E foi, talvez, essa coragem de revelar um
Caeiro simples, um Reis egoísta ou um Campos indisciplinado e turbulento, que sempre [co]existem em
cada um de nós, que o tornou esse Poeta maior da Literatura.
De vez em quando pela floresta onde de longe me vejo
e sinto, um vento lento varre um fumo, e esse fumo é a visão nítida e escura da
alcova em que sou atual destes vagos móveis e reposteiros e do seu torpor de
noturna. Depois esse vento passa e torna a ser toda só-ela a paisagem daquele
outro mundo...
Outras vezes, este quarto estreito é apenas uma cinza
de bruma, no horizonte d'essa terra diversa... E há momentos em que o chão que
ali pisamos é esta alcova visível...
Sonho e perco-me, duplo de ser eu e essa mulher. . .
Um grande cansaço é um fogo negro que me consome. . . Uma grande ânsia passiva
é a vida que me estreita. . .
Ó felicidade baça...
Para
o conhecer um pouco melhor, aqui ficam sugestões de encontros com o Poeta,
desde o Cancioneiro, à
Mensagem, passando pel' O Banqueiro Anarquista, O Eu profundo e os outros Eus, Poesias Inéditas...
... e um bonito poema
Dá a surpresa de ser.
É alta, de um louro escuro.
Faz bem só pensar em ver
Seu corpo meio maduro.
Seus seios altos parecem
(Se ela estivesse deitada)
Dois montinhos que amanhecem
Sem ter que haver madrugada.
E a mão do seu braço branco
Assenta em palmo espalhado
Sobre a saliência do flanco
Do seu relevo tapado.
Apetece como um barco.
Tem qualquer coisa de gomo.
Meu Deus, quando é que eu embarco?
Ó fome, quando é que eu como?
É alta, de um louro escuro.
Faz bem só pensar em ver
Seu corpo meio maduro.
Seus seios altos parecem
(Se ela estivesse deitada)
Dois montinhos que amanhecem
Sem ter que haver madrugada.
E a mão do seu braço branco
Assenta em palmo espalhado
Sobre a saliência do flanco
Do seu relevo tapado.
Apetece como um barco.
Tem qualquer coisa de gomo.
Meu Deus, quando é que eu embarco?
Ó fome, quando é que eu como?
10
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1930
In Poesia 1918-1930 , Assírio & Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas, Madalena Dine, 2005
In Poesia 1918-1930 , Assírio & Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas, Madalena Dine, 2005
Fernando Pessoa morreu a 30 de novembro de 1935, em Lisboa.
Aprendi bastante com esta Obra...
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