Modos de ver e de ouvir
Ouvidos versáteis - de Mozart a Muse
Franz não faz qualquer distinção entre música erudita e música ligeira.
Parece-lhe uma distinção hipócrita e anacrónica.
Gosta da mesma maneira de Mozart e de rock.
In ''A insustentável leveza do ser'', de Milan Kundera
A citação referida traduz perfeitamente a minha opinião acerca das distinções entre géneros musicais. Numa sociedade contemporânea que luta constantemente contra os preconceitos raciais, religiosos e de género, não faz sentido, por exemplo, um jovem sentir-se excluído de um grupo de amigos por se interessar também por música que se ouvia há três séculos ou por música que só se faz no outro lado do mundo. No primeiro caso, é de reforçar que a música erudita não é uma música de elites! Curiosamente, a música atual baseou-se convictamente nas raízes do passado, e são várias as bandas que inserem nas suas músicas alguns trechos do reportório erudito. Vejamos alguns exemplos:
A Whiter shade of pale, do grupo Protocol Harum, cuja introdução corresponde a uma variação da peça Air on the G string, de Bach.
It's a hard life, da banda Queen, onde um dos motivos musicais é similar ao da ária Vesti la giubba, do italiano Leoncavallo.
Os Queen |
Ainda dentro do poder da música dita ''clássica'', fica uma sugestão de visionamento peculiar:
Faço um parêntesis para uma pequena nota histórica: chegámos ao século XXI com um universo musical vastíssimo. Penso que é realmente impossível, no sentido mais forte da palavra, ter uma noção de quantas peças musicais já foram compostas ao longo da História da Humanidade! É ainda de salientar que SÓ se escreve (a) música desde o século XI. Realço o termo SÓ, porque se faz música há centenas e centenas de anos. Antigamente, as melodias passavam de geração em geração por tradição oral; o primeiro sistema de escrita musical (com algo similar ao que hoje conhecemos como pauta e figuras rítmicas) foi desenvolvido por Guido d'Arezzo, na Idade Média.
Mas voltemos ao nosso tópico: será que um exclusivo género musical poderá definir uma pessoa? Na minha opinião, não é aceitável rotular uma pessoa pelos seus gostos artísticos, ainda que seja difícil não sentir uma simpatia especial por quem admira a nossa banda favorita, é certo.
O que tento defender é que não se trata do género de música que se ouve, mas sim da qualidade desta. É evidente que mesmo a sua ''qualidade'' é extremamente discutível e subjetiva - daí que possamos chamar aqui a famosa frase ''gostos não se discutem'', mas podemos tentar avaliar uma obra musical pela sua letra (quando se trata de uma canção), pela instrumentação, pelo desenvolvimento do tema musical, entre muitos outros fatores. Estes aspetos variam consoante o género, mas não deixam de ser comuns à maior parte dos estilos musicais.
Numa sociedade atual tão aberta e livre, onde há grupos e subgrupos dos mais comuns aos mais raros, desde hippie's e punk's aos outros de que nem sequer recordo o nome, não se justifica que se seja intolerante perante as músicas que o outro ouve. Além disso, parece-me que a versatilidade é uma brilhante característica, também neste caso. Quem tem um bom par de ''ouvidos versáteis'' é quem sai a ganhar… Um melómano ouve de tudo um pouco e regozija-se com música de qualidade! E não é preciso muito mais para se ser feliz no campo musical, se é que este conceito é possível. As distinções entre géneros musicais são hipócritas e anacrónicas; é vantajoso ser um ouvinte versátil…
Ana Margarida Simões, 12º LH
Referências bibliográficas:
Wikipedia . (2015, janeiro 2) It's a hard life. Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/It's_a_Hard_Life
Wikipedia. (2014, dezembro 30). A whiter shade of pale. Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/A_Whiter_Shade_of_Pale
Comentários
Enviar um comentário