a ciência também é cultura
nos caminhos da psicologia [o que é a memória]
A memória constitui uma espécie de retrato do que somos, composta com os traços do que fomos.
Georges Gusdorf
Memória é um processo cognitivo que compreende a retenção e
a recuperação da informação. É um sistema aberto em que a informação entra
(aquisição) é armazenada (retenção) podendo depois ser recuperada (recordação).
Sobre a memória, António Damásio, reconhecido neurologista
que investiga sobre o processo da constituição do eu, diz-nos:
“Desde que uma cena tenha algum valor, desde que na altura
houvesse suficiente emoção, o cérebro apreende imagens, sons, odores e sabores,
num registo multimédia, e irá recuperá-los na altura própria. Com o tempo, a
recordação poderá desvanecer-se. Com o tempo, e com a imaginação de um
fabulista, o material será embelezado, baralhado e voltará a ser ordenado num
romance ou num argumento
cinematográfico. Passo a passo, aquilo que começou como imagens fílmicas
não-verbais poderá mesmo transformar-se num relato verbal fragmentado,
recordável tanto pelas palavras de uma narrativa como por elementos visuais e
auditivos.
António Damásio |
Consideramos agora a
maravilha que é a recordação, e pensemos
nos recursos de que o cérebro tem de dispor para a produzir. Além das imagens
percetuais em vários domínios sensoriais, o cérebro tem de dispor de algum modo
de armazenar algures os respetivos padrões, e tem de manter um caminho,
algures, para recuperar os padrões, para que algures, de certo modo, a
reprodução venha a funcionar. Quando isto acontece, e desde que também haja um
eu em funcionamento, descobrimos que estamos no meio de uma recordação.
A capacidade que temos para manobrar o mundo complexo que
nos rodeia depende desta possibilidade de aprender e de recordar apenas
reconhecemos pessoas e locais porque criamos registos da sua aparência e
recuperamos parte desses registos na altura própria. A nossa capacidade para
imaginar eventuais acontecimentos também depende da aprendizagem e da
recordação, e é o fundamento do raciocínio e da navegação imaginária do futuro e, de uma forma mais geral, da criação de
soluções inovadoras para um problema. Para entendermos como tudo isto acontece
temos de desvendar no cérebro os segredos do ”certo modo” e localizar os
“algures”. Esse é um dos problemas mais complexos da neurociência contemporânea.”
António Damásio (2010). O Livro da consciência. Uma arquitetura para a memória.
Lisboa: Círculo Leitores, pp.168-169.
Elaborado por: Emília Laranjeira
Comentários
Enviar um comentário