promessas de abril


Páginas de Liberdade

     Enquanto adolescente, não me deram a conhecer a liberdade escondida nos livros. Havia palavras proibidas, fechadas a cadeado, e quem ousasse escrevê-las, pronunciá-las ou cantá-las era imediatamente silenciado e brutalmente afastado da sua vida de cidadão comum, perigosamente à solta. 

    Então, calavam-se as vozes e riscavam-se páginas com lápis azul, protegendo-se, assim, a ordem e a paz reinantes. Para muitos, era a descida aos infernos. Apagava-se a luz de uma esperança timidamente ousada e a noite prolongava-se por dias, meses e anos, abafando o desespero dos que se calavam. Mil vezes a tortura, a fome, a solidão e a morte que trair o ideal que não denunciavam.

    Nas escolas, não se falava destas palavras. A mordaça que cingia o país estava bem apertada, não permitindo qualquer distração. Não se podia correr o risco de despertar nos jovens eventuais consciências revolucionárias. A Mocidade era, obviamente, Portuguesa e, como tal, bem disciplinada. Obediência era a palavra de ordem. Pensar tornara-se perigoso, mas, mesmo assim, havia quem pensasse, havia quem ousasse, havia quem não obedecesse. 

    Felizmente, como “ não há machado que corte a raiz ao pensamento”, as palavras sufocadas acabaram por cumprir o seu destino e, assim, certo dia, conseguiram fugir e voar nas asas de uma gaivota, pintando com novas cores páginas de esperança. A metamorfose aconteceu: o país, outrora amordaçado, vestiu-se de cravos vermelhos e, desta vez, as armas não falaram mais alto do que os poetas e os homens, sem medo, soltaram a voz entoando “Grândola Vila Morena”, a tal terra da fraternidade tão desejada. 

   Hoje, nas escolas, já não se escondem as palavras nem os livros. Estes, como testemunhas silenciosas do passado e sentinelas vigilantes do presente, oferecem, agora, sem medos nem sobressaltos, verdadeiras páginas de liberdade!

Madalena Toscano

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