Memorial do Convento

… a ler


Escrevo este mês sobre uma obra do nosso Nobel da Literatura: Memorial do Convento, de José Saramago.
Este autor nasceu na Golegã, Azinhaga, em novembro de 1922 e faleceu em junho de 2010, na ilha de Lanzarote. Dentro das inúmeras profissões que teve, onde se podem contar pelo menos seis, foi na Literatura que Saramago se distingiu excecionalmente, ganhando em 1995 o Prémio Camões, o mais importante prémio literário português e, em 1998, o Nobel da Literatura, como já anteriormente referido.

          Fig.1 – Capa da 48º edição da obra


O Memorial do Convento é um romance histórico-social e de intervenção. Oferecendo-nos uma minuciosa descrição da sociedade portuguesa no início do século XVIII, onde sobressai o operariado oprimido, a obra denuncia os excessos sociais que se mantêm na primeira metade do século XX. Caracteriza, pois, uma época diferenças sociais, que se mantêm na atualidade: opulência/miséria, poder/opressão, devassidão/penitência, sagrado/profano…
São três as principais linhas condutoras da ação: a construção do convento de Mafra, as relações entre Baltazar/Blimunda e D. João V/D. Maria Ana e a idealização e concretização da passarola. A ação principal é a da construção do convento de Mafra, que entrelaça o desejo megalómano do rei com o sofrimento do povo. Paralelamente, encontra-se uma ação que envolve Baltazar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas, numa história de espiritualidade, de ternura, de misticismo e de magia. Devido a esta relação, acabam por ajudar Bartolomeu Lourenço, o padre responsável pela idealização da passarola e que é protegido pelo “rei-mecenas”, D. João V.

                       Fig.2 – Esquema da passarola


Desde o início que esta obra se apresenta como uma crítica cheia de ironia e sarcasmo à opulência da nobreza por oposição à extrema pobreza do povo, como evidenciado na seguinte passagem: “Esta cidade, mais que todas, é uma boca que mastiga de sobejo para um lado e de escasso para o outro”. O adultério e a corrupção dos costumes são fatores de sátira ao longo da obra.


                                                                Fig.3 – Desenho do Convento de Mafra


Revelando-se anti-monárquico, angustiado e pessimista, Saramago apresenta uma caricatura da sociedade portuguesa da época de D. João V. Nas questões religiosas, não só usa a ironia, como também se revela frontal nas apreciações à Inquisição. O povo português facilmente se deixa manipular pela Igreja, pelos seus mandamentos anacrónicos e muito afastados dos princípios defendidos por Jesus Cristo.
Embore leve o seu tempo, Memorial do Convento é um livro que vale a pena ler (quase que imperativo; o famoso “livro amarelo” não substitui a leitura), por ser uma obra que critica intemporalmente os vícios e defeitos da sociedade: a Igreja e a sua hipocrisia, os ricos e a sua ganância, o povo e a sua apatia perante as injustiças.


Afonso Marques, 12º CT3





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