Saber, para bem viver

Do ato à consequência  
[a propósito das consequências de uma gravidez não planeada]


Num ciclo menstrual de 28 dias, é comum considerar-se que, ao décimo quarto dia do ciclo, ocorre a libertação de um gâmeta feminino (ovócito II) do ovário - ovulação. Após ter sido capturada pelas trompas de Falópio, esta célula, irá durar cerca de 24h, período durante o qual poderá vir a ser fecundada. Caso tal acontecimento se verifique, formar-se-á uma célula – zigoto que, daí em diante, irá passar por uma sucessão de divisões celulares. À medida que as divisões se sucedem o embrião, com o auxílio das trompas de Falópio, vai sendo movimentado no sentido do útero, onde chega cerca de 7 dias após a ovulação. Nesta altura o embrião é constituído por uma bola de células amalgamadas no interior das quais existe uma cavidade. Chama-se blastocisto.

Por volta do 10º dia, este embrião instala-se no revestimento interno do útero (endométrio) que entretanto se preparou para o receber – ocorre a nidação: até agora não existiu falha menstrual pelo que a mulher não sabe que está grávida. As células embrionárias continuam a dividir-se e o embrião liberta enzimas que penetram no revestimento uterino fazendo com que os tecidos se desintegrem o que proporciona uma espécie de banho de sangue no qual se encontra inserido o novo ser. É a partir deste “caldo nutritivo” que o embrião se irá alimentar, inicialmente por difusão.

Durante a segunda semana de vida do óvulo fertilizado, inicia-se a diferenciação celular. Um agregado celular forma o saco amniótico no interior do qual o novo ser irá crescer rodeado de líquido – líquido amniótico. Neste meio, o embrião estará mais protegido contra eventuais choques e poderá movimentar-se sem sofrer o efeito do seu peso já que flutua no líquido. A partir de um dos agregados celulares que se formam nesta fase, irá formar-se o bébé. Estas células, cujo número está continuamente a aumentar, originam durante a 3ª semana de gestação, um ser onde se começa a evidenciar a cabeça e na extremidade oposta, uma espécie de cauda.

Nesta altura (3ª semana de gestação), já passou cerca de uma semana após o dia em que era suposto ter havido menstruação. Embora sem ter a certeza, a mulher começa a suspeitar que possa estar grávida.

Após cinco a seis semanas de gestação, no novo ser já é possível observar além da cabeça, o pescoço, olhos e orelhas rudimentares, o cérebro e o coração que já bate. Já existem rins, circulação sanguínea, sistema digestivo do qual já consta o fígado e umas pequenas saliências corporais a partir das quais se irão formar os braços e as pernas. Surge igualmente o primórdio da coluna vertebral. Agora com o tamanho de um grão de café, o embrião faz lembrar uma pequena miniatura de um cavalo-marinho.

Às oito semanas de gravidez o embrião é tão pequeno como o dedo mínimo do pé. Flutua no líquido amniótico como um astronauta, embora se encontre ligado à mãe. O coração já bombeia vigorosamente o sangue, o cérebro brilha através da pele, tão fina como papel vegetal revelando os minúsculos vasos sanguíneos. A maxila ainda não está completamente formada mas o rosto é reconhecidamente humano. As orelhas têm ainda uma posição muito inferior e os olhos estão cobertos por uma pele intacta que acabará por se fender e originar as pálpebras. A cabeça é enorme em relação ao corpo. Os membros alongam-se e surgem os cotovelos e os joelhos. Nesta altura o bébé começa a dar os primeiros pontapés, mas a mãe ainda não consegue sentir o seu movimento.


Entre o segundo e o terceiro mês de gravidez, completa-se a formação da placenta. Por volta das doze semanas, todos os órgãos internos estão formados e alguns deles já funcionam. Os órgãos genitais desenvolveram-se embora ainda não dê para identificar o sexo. As orelhas e nariz estão completamente formados e nas mãos e pés já são percetíveis os dedos. Pelo cordão umbilical começou a circular o sangue entre o embrião e a placenta, sendo nesta altura que esta começa a funcionar. A partir de agora, o bébe será designado por feto e o resto da sua vida no útero, irá ser passada a crescer. Tem cerca de 5 cm, está a começar a chupar, faz caretas e apresenta expressões faciais. Engole igualmente líquido amniótico, deixando-o regurgitar da sua boca ou descer até à bexiga.

Embrião com 12 semanas


Alguns pontos de reflexão

Um dos primeiros sistemas a desenvolver-se é o sistema nervoso, sendo que a sua formação se inicia bem antes de se saber que existe uma gravidez.

Iniciam igualmente a sua formação, ainda que numa fase muito precoce, praticamente todos os órgãos vitais, como, por exemplo, o coração, os rins e o fígado.

Logo após a implantação do embrião no útero, a sua nutrição é assegurada pelo sangue materno acumulado em lacunas do revestimento uterino. Embora não exista contacto direto do sangue materno com o embrião, a comunicação é feita através de uma membrana cuja capacidade seletiva é praticamente inexistente. Nesta fase, os nutrientes e o álcool que a mãe ingerir, os medicamentos que tomar, as drogas que usar, o fumo que inalar, irão chegar ao embrião sem que seja possível fazer qualquer seleção. Mesmo após a entrada em funcionamento da placenta (3º mês de gestação), esta funciona como um filtro de café, os grãos deste nunca passam mas as substâncias suas constituintes podem passar.

Durante a gravidez
substâncias tóxicas prejudicam o desenvolvimento do futuro bebé.
Se a futura mãe sofrer de doenças provocadas por vírus, bactérias ou mesmo protozoários (pequenos seres unicelulares) é possível que o ser em desenvolvimento seja também afetado.

Admitindo que ocorre uma gravidez não planeada, é possível que só venha a ser confirmada mais de três semanas após a fecundação. Caso nesta altura não tenha havido cuidado com todo o tipo de substâncias ingeridas, inaladas ou injetadas, é possível que o desenvolvimento normal do bébé venha a ficar seriamente comprometido, uma vez que é justamente nesta primeira fase da sua formação, que se verificam os acontecimentos mais importantes e determinantes do normal desenvolvimento do novo ser. A formação dos principais órgãos vitais nesta fase inicial, deixa antever que, caso algum acontecimento possa perturbar o seu normal desenvolvimento, o novo ser possa vir a nascer com anomalias que podem não só comprometer a sua sobrevivência, como a sua qualidade de vida de forma irreversível. É importante lembrar que as células nervosas com que nascemos, e de cujo funcionamento normal dependemos a todos os níveis, se formam numa das fases mais precoces do desenvolvimento embrionário e, uma vez diferenciadas, perdem capacidade de divisão. Por outras palavras, é praticamente impossível reparar e substituir células nervosas, após a sua formação.

Considerando que a futura mãe nem sequer tem por hábito registar os dias em que é menstruada, apesar de ser sexualmente ativa, o risco de vir a confirmar uma hipotética gravidez não planeada numa fase mais tardia, torna-se ainda maior, como podem também ser maiores as consequências que daí podem advir para a novo ser.

Nenhum de nós pediu para nascer, mas qualquer um de nós se deve sentir responsável pelo desenvolvimento harmonioso de um novo ser que, também não tendo pedido para vir ao mundo, tem o direito de exigir que aqueles que contribuíram para a sua formação, o tratem de forma digna e responsável desde o momento da conceção!

Ninguém se deve sentir no direito de comprometer a qualidade de vida de um ser humano, em consequência de comportamentos irrefletidos e por vezes irresponsáveis.

A gravidez deve ser pensada e planeada. Existem substâncias que devem ser tomadas antes de engravidar, pois revelam-se preventivas do desenvolvimento de determinadas malformações. Estudos recentes mostram que a toma de ácido fólico alguns meses antes de engravidar, reduz as hipóteses do bébé nascer com espinha bífida.  A toma da pílula tem de ser interrompida alguns meses antes de engravidar. Existem medicamentos tomados para tratar determinadas doenças, que são considerados teratogénicos (causadores de malformações) que não podem ser tomados durante a gravidez. A ingestão de álcool deve ser evitada, o consumo de drogas, particularmente durante a gravidez, deve ser interrompida. Até o contacto com certos animais como os gatos deve ser evitado.


A gravidez não é um estado de doença, mas deve ser encarado como uma fase de grande responsabilidade! O que pode uma mãe sentir, caso dê à luz um bebé portador de qualquer deficiência para a qual ela sinta que pode ter contribuído?
Julieta Marques

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