Memórias perdidas






Richard Glatzer e Wash Moreland realizaram o filme “O meu nome é Alice”, baseado num bestseller da escritora norte-americana Lisa Génova, também professora na Universidade de Harvard e doutorada em Neurociência.
O filme retrata bem a fragilidade de que o ser humano é feito. Quando a sua vida parece ter atingido uma doce estabilidade, já com os filhos adultos, com uma carreira construída e reconhecida no ensino universitário e com um casamento feliz, a protagonista, Alice Howland, começa a sentir os sintomas da doença de Alzheimer, o que a abala profundamente. 
Apesar de naturalmente revoltada contra o mal que lhe vai roubando as memórias que foi acumulando ao longo da sua vida e que constituem a sua identidade como pessoa, Alice decide lutar, com muita dignidade, para se manter ligada ao mundo e aos afetos que foi criando.
Vamos, assim, acompanhando a personagem central na sua progressiva caminhada para o esquecimento, testemunhando a sua força nos momentos de lucidez, mas também a indizível dor de ir perdendo, irreversivelmente, a profissão de que tanto gostava, o domínio das palavras que tanto a fascinavam enquanto linguista e, sobretudo, os laços afetivos com os filhos e o marido.
Ora, embora o filme se centre na forma como a doença afeta a vida de quem a tem, a verdade é que também documenta o efeito avassalador que uma doença com estas características pode ter na família do doente. É terrível assistir à decadência das pessoas que nos habituámos a ver fortes, lúcidas, ativas, sobretudo quando essas pessoas que se vão afastando de nós para sempre nos são tão queridas e significam tanto para nós. Embora fisicamente presentes, já não são as mesmas, porque perderam uma parte delas – a sua própria identidade. E conviver diariamente com esta situação é um sofrimento atroz, porque sabemos que nada podemos fazer para a inverter. 
Além disso, o filme aborda também uma questão interessante no que respeita à relação entre pais e filhos. A filha mais nova de Alice, Lydia, curiosamente a mais rebelde dos três filhos, a que parecia mais desligada da família e que mais desentendimentos tinha com a mãe, assume a iniciativa de cuidar dela, quando Alice já não pode ficar sozinha e todos os outros elementos da família prosseguem os seus projetos de vida. Apesar de parecer distante, a verdade é que Lydia tomou uma decisão madura e responsável, mas sobretudo de grande amor e carinho pela mãe. Quando esta realmente necessitou da sua presença e dos seus cuidados, Lydia convictamente mostrou a sua disponibilidade. Numa família, ter pontos de vista diferentes e discutir não significa, de forma alguma, que os afetos não existam ou não sejam fortes. E Lydia provou exatamente isso: o amor fala mais alto do que qualquer desavença. 
 “O meu nome é Alice” é, por tudo isto, um filme, que aborda com delicadeza e sem dramatismos excessivos, uma realidade triste. A doença de Alzheimer existe, não tem cura e muda para sempre a vida de quem a tem, aos poucos, como uma morte anunciada. Traz inevitavelmente dor e tristeza a familiares e amigos, que se sentem impotentes. É um filme que vale a pena ver, que faz bem ver, não só porque nos lembra o quão importante é valorizar os momentos felizes que temos o privilégio de viver uns com os outros, construindo memórias felizes, como também nos incita a lançar um olhar mais atento, tolerante e carinhoso, sobre as pessoas que sofrem da doença de Alzheimer – para as quais viver perdeu quase todo o sentido.
Maria Bita, 12.º LH1

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