conhecer o passado, pensar o futuro
... a propósito do centenário da 1.ª Guerra Mundial
Daqui a quatro anos, novembro será o mês onde de assinalará o final da 1.ª Grande Guerra.
Nunca deixámos de viver ensombrados pela guerra. No entanto, as muitas décadas de paz na Europa, pelo menos na Europa onde vivemos, tornam distante o horror da perda que é uma constante para os que nunca conheceram outra realidade senão a de um mundo em guerra.
Para que a nossa terra a volte a ser adubada pelos que tombaram na guerra.
A guerra
Tanto é o sangue
que os rios desistem de seu ritmo,
e o oceano delira
e rejeita as espumas vermelhas.
que os rios desistem de seu ritmo,
e o oceano delira
e rejeita as espumas vermelhas.
Tanto é o sangue
que até a lua se levanta horrível,
e erra nos lugares serenos,
sonâmbula de auréolas rubras,
com o fogo do inferno em suas madeixas.
Tanta é a morte
que nem os rostos se conhecem, lado a lado,
e os pedaços de corpo estão por ali como tábuas sem uso.
Oh, os dedos com alianças perdidos na lama...
Os olhos que já não pestanejam com a poeira...
As bocas de recados perdidos...
O coração dado aos vermes, dentro dos densos uniformes...
Tanta é a morte
que só as almas formariam colunas,
as almas desprendidas... — e alcançariam as estrelas.
E as máquinas de entranhas abertas,
e os cadáveres ainda armados,
e a terra com suas flores ardendo,
e os rios espavoridos como tigres, com suas máculas,
e este mar desvairado de incêndios e náufragos,
e a lua alucinada de seu testemunho,
e nós e vós, imunes,
chorando, apenas, sobre fotografias,
— tudo é um natural armar e desarmar de andaimes
entre tempos vagarosos,
sonhando arquiteturas.
Meireles, C. (s/d). Mar absoluto. Porto Alegre: Livraria do Globo.
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